domingo, 29 de julho de 2012

Saudades do futuro.



A memória de tempos que não vivi, ao lado de alguém que não sei se existe no mundo real.

Muitos poetas falam da saudade do que não se viveu. Saudade até de tempos que não existiram. Mas como se pode ter saudade daquilo que não foi concretizado? Como posso sentir falta de algo que não foi real? Creio que as nossas vidas transcendem a estas frágeis e curtas noções. Creio que podemos sentir saudade da vida inteira que poderia ter sido e não foi.
Pode parecer confuso o que digo, pode parecer uma tentativa frustrada de costurar ideias desconexas, mas meu caro leitor olhe por cima do muro que o trava e viaje um pouco neste meu raciocínio peculiar... Nossa ideia de tempo é frágil e limitada as nossas necessidades básicas diárias, achamos que o tempo é apenas aquilo que nosso relógio marca, esquecemos que o tempo também é protagonista de nossas vidas, um protagonista que nós criamos. Se o tempo é um instante o qual ousamos descrever, significa que ele tem sua abstração. Ele não pode ser limitado àquilo que parece ser. O tempo está associado a momentos que vivemos.
Se o momento que de fato vivemos é tudo aquilo que mexe com nossas emoções e com o que há de mais escondido na alma, nossos sonhos também são momentos que vivemos. Porém, quando sonhamos, estamos numa outra dimensão que não sabemos descrever ao certo, mas que às vezes chamamos de limbo. Se viver é a realidade que nos cerca e que somos capazes de sentir, nosso limbo pode sim ser a nossa realidade. Quantas vezes sonhamos com tamanha força que ao acordar queremos voltar a dormir? Por vezes os sonhos nos consolam, são capazes de nos fazer felizes muito mais que estar acordado. Quando se trata de sonhos tudo é mais abstrato.
Meu confuso leitor, ente tantos conceitos de tempo, sonho, realidade, saudades de tudo isto, e olhando para as primeiras linhas deste texto tentando recapitular o que foi dito, você deve estar perguntando também se posso ter saudades do futuro. Eu afirmo que sim. Se o nosso futuro é um sonho do passado, daqueles que escondemos bem de todo mundo, se este sonho por algum motivo deixa de ser sonhado ou se torna impossível de realizar seja por qual for o motivo, por vezes dá saudade de sonhá-lo. Sinto falta da sensação de bem estar que ele me causava, aqueles sonhos seriam o meu futuro um dia, e se os meus sentimentos são a minha realidade, se a minha realidade é algo tão abstrato quanto minha própria noção de tempo, me perco nas sensações de passado e futuro e posso sim ter saudades do futuro que um dia quis para mim!
Passado, presente e futuro se misturam em nossa mente... Mas ainda assim, como podemos sonhar com o futuro? Os franceses denominam esta sensação de ‘déjà vu’, que em tradução livre significa ‘já visto’. Quando vivemos algo e sentimos a certeza de já ter visto aquela cena, quando conhecemos alguém neste exato momento e temos a sensação de já conhecê-lo, quando visitamos um lugar completamente novo e sentimos que já tínhamos estado lá, todas estas sensações que experimentamos nos deixam perdidos em relação a nossa frágil noção de tempo. O futuro que estava guardado no passado? Nada mais óbvio, afinal o futuro é o nosso reflexo do passado.
                Não seja simplório ao resumir tudo... Não me diga que não pode se ter saudades, por exemplo, de um tênis que não se comprou! Posso sim ter saudades da sensação feliz que a IDEIA de comprar aquele tênis me causou e ele ser meu em devaneio. Posso tê-lo desejado ao ponto de em outra dimensão ele ter sido meu. A realidade não é apenas aquilo que é mostrado na nossa frente todos os dias, a nossa realidade individual é também tudo o que sentimos, sonhamos, desejamos, experimentamos e algumas vezes realizamos. O conceito de realidade quase sempre sai da boca amargurada dos que não sonham. Não se limite a achar que a realidade é apenas o palpável, o visto. Em um mundo de máscaras sociais nunca sabemos o que é realidade ao certo.
                Passado, presente e futuro quase sempre se misturam. Sonho e realidade quase sempre é a mesma coisa. As horas estão mais soltas que o vento. O que nos falta é liberdade para entender. E agora o que me resta é saudade do meu futuro que anda perdido em algum lugar.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Vingando-se da Morte.


                A melhor forma de vingar-se da morte é ter a melhor vida possível. Nada podemos fazer para fugir da indesejada das gentes, mesmo que completemos 100 primaveras, um dia partiremos deste mundo, voltaremos ao mistério de nossa existência, o tempo fará com que fiquemos no ontem. É uma verdade cruel a nós humanos sabermos que um dia ninguém saberá das nossas dores, angústias, felicidades e conquistas do hoje.
Mas afinal, qual o sentido de tudo isto? Qual o sentido desta caminhada rumo ao desconhecido? O que podemos fazer para que tudo valha a pena? O sentido deste caminho é o rumo que damos a ele. O sentido das nossas vidas é aquele que nos faz feliz. O que nos resta a fazer é vivermos todos os momentos que nos fazem bem, nos jogarmos na vida sem contar com o amanhã, afinal não sabemos o que nos reserva o amanhã, talvez o futuro seja apenas o reflexo do que é construído no agora. A nossa fragilidade humana cria expectativas de um amanhã para que nos limitemos, possamos nos manter calmos e conformados, mas meu esperançoso leitor, se nós formos capazes de olhar por cima do muro que nos trava, veremos, não existe nada além do reflexo do agora.
                Por vezes tentamos viver o passado, noutras tentamos viver o futuro, nos perdemos meio as nossas expectativas e tentamos viver todos os dias de uma só vez. Mas não conseguimos. Um dia de cada vez. Só assim aguentamos carregar toda a nossa bagagem, toda a história da nossa existência. Dosar o tempo não é tarefa fácil. Aliás, o que é o tempo? O tempo é a tentativa frustrada do ser humano controlar o amanhã. O tempo é a tentativa sem sucesso de cada um de nós sabermos o que nos reserva a página seguinte. O tempo é a ilusão que criamos a cerca do amanhã. Os dias, o tempo, o futuro, todos são segredos criados por nós, segredos que misteriosamente nos acalmam.
                Solitário leitor, se me perguntares por Deus, se você argumentar dizendo que Deus tem um plano especial para as nossas vidas, eu retruco respondendo com algumas perguntas: E as nossas escolhas, também são planos de Deus? Somos fantoches do abstrato criador de tudo? Não seria egocentrismo achar que com tantos problemas no mundo, tantas doenças incuráveis, tanto caos sobre a terra, Deus se importaria com as bobagens que nos afligem a cada 5 minutos? Não acho que Deus em sua infinita bondade seria tão passivo para assistir tudo e nada fazer, assim como não posso crer que Deus seria um carrasco de castigar nossos pequenos delitos diários. Não posso crer que Deus seria o reflexo semelhante de tamanha imperfeição humana. Não posso crer que nós humanos limitados seríamos capazes de entender Deus. Mas ainda assim creio que a ideia Deus nos faz bem. É muito cruel imaginar que estamos sozinhos, que nada faz sentido, que nada podemos fazer contra a morte, que somos apenas resultado da evolução de outros animais.
                Meio a tantos mistérios existenciais, meio a tantas dores sem motivo, meio a tantas ilusões que nos consolam, seguimos nossas vidas, carregamos a beleza desta chance maravilhosa que temos para fazermos o melhor pelo semelhante e por nós mesmos. Carregamos a chance de sermos felizes todos os dias. E a nossa felicidade, a nossa cura, a nossa paz interior só depende do que construímos dia após dia.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Saudade e seus Reflexos.


                A saudade é o reflexo dos momentos maravilhosos que vivemos. Por vezes ela é o nosso bálsamo, outras ela é a nossa cruz. Sentimos saudade de um tempo, de uma pessoa, de uma música, de um cheiro. Sentimos saudade de um abraço apertado, de um aperto de mão firme, de um sorriso sincero. Sentimos saudade de conversas bobas, de piadas, da voz. E essa saudade nos consola por revivermos aqueles momentos ao lembrar, mas também nos angustia por não podermos vivê-los novamente.
                O que nos resta quando queremos olhar, sentir, conversar, beijar, abraçar alguém outra vez e já não é possível? O que fazer com esta angústia infinita que trava o peito e deixa nossa alma amarga? É uma sensação desesperadora e sufocante. Nada que se diga ou faça adianta. Nada diminui a dor de não ter mais alguém perto de nós, do tempo ter deixado quem amamos no ontem, de estarmos morando em mundos diferentes. A religião nos ensina que sempre teremos quem amamos por perto, que alguém ao encantar-se vem morar em nosso coração e além de nós, quem amamos morará na luz divina, na força criadora do universo, no recomeço de nossa existência. Mas o que resta a nós que ficamos? As lembranças, os ensinamentos, as fotografias, a saudade, sempre a saudade.
                Saudade que nos consome a cada memória. Saudade que nos consola com os risos que foram divididos. Quando eu me lembro dos momentos que vivi ao lado da minha avó penso em tudo que construímos juntas, em tudo que ela me ensinou. Lembro-me das tardes sentadas juntas conversando, lembro-me do amor mutuo que tínhamos, lembro-me dos risos, dos passeios, de dormirmos juntas, de ter sua proteção, de ter a honra de tê-la como avó. Todo este tempo ao lado dela foi maravilhoso. Sinto como se ela estivesse agora sempre ao meu lado, mas esta saudade é sufocante.
                O que me consola, e o que eu espero que console a minha mãe, meu tio, os outros parentes e aqueles que gostavam de sua companhia é o fato de saber que ela foi muito feliz durante toda a vida. Fez o que quis, disse o que quis, recebeu infinitamente o nosso amor, e legou a nós sua felicidade. Ela carregava no bolso sempre uma piada pronta, carregava sempre um sorriso camarada, e trazia sempre aquela força de sertaneja mais forte que a vida e a morte. Força que precisamos ter agora para seguir em frente e fazer o melhor dentro das possibilidades que se apresentem. Força de entender que um dia nos reencontraremos, força de aceitar que apesar da distância que nos separa agora nada irá apagar o que foi vivido ao seu lado.
                Espero minha avó que eu tenha herdado sua força para superar esta saudade sufocante, espero que eu tenha herdado a sua felicidade constante, o seu bom humor para que neste momento de tempestade eu seja capaz de fazer florir paz no coração de nós que ficamos do lado de cá da margem da vida, espero que apesar da despedida a sua alegria de viver nos console. No mais, repito suas últimas palavras para mim, até breve minha querida! 

sexta-feira, 20 de julho de 2012

A Incerteza da Vida.



                A vida passa muito rápido. Como num piscar de olhos partimos para um mundo desconhecido que está além da nossa compreensão. Gastamos tanto tempo para entender isto, entender a nossa falta de controle sobre o amanhã que por vezes perdemos o foco e deixamos de aproveitar o que é mais importante: o hoje. O amanhã é uma ilusão. O amanhã é um consolo para não vivermos atormentados por não conseguir fazer tudo que gostaríamos no hoje. Permitimo-nos acreditar no amanhã porque precisamos ter a esperança que algum dia será como nós realmente desejamos.
Faça um teste caro leitor solitário, tente programar hoje todo o seu dia seguinte com riqueza de detalhes, seja bem descritivo. O outro dia te provará o que digo agora, nunca, nada na vida é como queremos. Não temos o controle de tudo. Não sabemos de nada diante deste enorme espetáculo da vida. A nossa única certeza é o agora. Pode parecer extremado todas estas palavras desconexas, mas elas carregam a racionalidade de tristes experiências. A maior frustração humana é não saber de si próprio. O outro parece sempre saber mais de nós que nós mesmos. O outro sempre tem mais poder sobre nós e assim tecemos uma rede de conexões que lembram o efeito borboleta.
O outro assiste o nosso nascimento quando não sabemos nada do mundo, o outro nos leva flores ao túmulo quando já não vemos, o outro sabe o que fará com o amor que damos a ele, o outro nos aprova ou reprova na sociedade, o outro nos julga, nos calunia, nos oprime. O outro nos faz feliz por instantes ou pelo resto da vida, o outro, sempre o outro. Se tentarmos nos livrar do outro não sobreviveremos um dia sequer. Afinal ninguém é capaz de sobreviver sozinho por muito tempo. Estamos entregues ao outro, a vida, ao acaso. Dentro desta limitação humana reagimos criando a esperança de que nada acaba aqui. Criamos a religião, criamos um deus a nossa semelhança, criamos o amanhã, criamos o tempo, criamos tudo que alivia esta angústia do nada, de nos sentirmos nada, de vivermos para nada.
Norteamos nossas vidas e fazemos dela a mais bela criação do mundo. Afinal, não podemos desperdiçar a chance que temos de criar certezas meio a tanta incerteza. O que levamos da vida é tudo que construímos enquanto estamos vivos. O que levamos desta passagem rumo a incerteza de algo além, é o amor que cultivamos, os momentos vividos ao lado de quem amamos, o respeito, a solidariedade, os risos, as festas, as viagens. O que levamos da vida é a felicidade que construímos na liberdade que temos. É preciso passar adiante alegria. É preciso construir amor. Deixar ao outro o nosso sorriso sempre. Mesmo nos momentos de dor. Sorrir mesmo quando nada é como queremos afinal estamos aqui para lutar e construir a nossa felicidade.
Não sabemos do dia seguinte. O amanhã é o maior mistério da vida de todos nós. O que nos resta é o hoje. O hoje determina a nossas vidas com uma intensidade poderosa e escorregadia as nossas mãos. E se somos assim tão impotentes precisamos da consciência do que estamos construindo. Precisamos legar o respeito, a amizade, a ternura, o sorriso, a felicidade. Pois será este o consolo para os que amamos no momento de nossa partida, saber que fomos felizes no hoje que vivemos.    

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Hoje toca frevo no céu.


                Hoje tem uma festa arretada no céu. A música que toca é um frevo dos bons. Os anjos ficam todos de pé para celebrarem e receberem a dona da festa...
E com grande alegria saúdam:
- Dona Leide, a senhora chegou!
E ela responde:
- Oxente! Que lugar é esse?
-Esse lugar é a mistura de todos os lugares onde a senhora foi feliz!
-Mas Homi, que história é essa? Ela retruca.
O anjo diz:
- Olhe aqui um pedacinho de Palmares, olhe Recife. Mais ali Fortaleza, São José do Ribamar, São Luis, Teresina, e olhe, Campo Maior. Mas Dona Leide tem um pedaço também de todos os lugares que a senhora quis conhecer e não deu tempo...
- Mas veja só! Ali é o Lemos! Ali são meus irmãos, pai, mãe, até vó Rosa, que saudade que eu estava deles.
- Pois é Dona Leide, está todo mundo aqui!
- Homi do céu! Eu não tô sentindo mais nenhuma dor, veja só! Consigo até dançar esse frevo! Simbóóra oooooi! Oxente, mas eu ainda tô vendo gente chorar, largue de frescura homi! Eu vou agora para essa grande viagem, avie, que eu tenho mais o que fazer!
- Pois  vamos dona Leide, que aqui é só alegria...

...
                E desta pernambucana arretada sempre haverá saudade. Pois ela foi a melhor bisavó, a melhor avó, a melhor mãe e a melhor companhia que todos nós poderíamos ter. Tudo ao seu lado era riso, frevo e festa. E agora que ela encantou-se, veio morar para sempre em nosso coração.
                Muito obrigada pela honra de fazer parte da sua vida. Nós que sempre te amamos infinitamente, te daremos a eternidade em nossas memórias.
Saudade vó.