quarta-feira, 11 de abril de 2012

Resposta a um Jovem Burguês


                Depois de divagações e devaneios, inúmeras futilidades, eis que o jovem burguês pergunta o que é a vida à primeira moça que vê passar na rua, como se pudesse enxergar além de seus olhos... E ela responde:
                ‘- Bote a cara lá fora onde o sol é cruel e turvo como a realidade. Venha conhecer o outro lado. Encare que o mundo não é bom nem belo. Sinta nas costas a dor de amanhecer vivo. Saiba o significado do passar dos dias para quem não tem como viver e vive. O que significa a vida para quem nem consegue sobreviver. O valor da vida para os esquecidos, marginalizados e dispensados por todos. O valor da vida para quem se vê com uma vida sem valor. Olhe pela janela. Mais que clichê, ainda há crianças morrendo de fome. Há velhos que carregam a vida [o peso da vida] como algo negociável. Há jovens prostituindo suas manhãs em troca de pão e droga, buscando a ilusão da esperança. Há jovens matando e roubando em busca de preencher o vazio de seus dias. Ainda assim eles insistem em viver, idiotas! Lá fora ainda existem pessoas que acreditam que o mundo pode ser um lugar melhor. Não, não pode. Meu caro, a vida e o mundo são a mesma coisa. O mundo toma forma lentamente a cada escolha da vida de alguém. O meu mundo e o seu mundo são diferentes. Ainda assim estamos aqui. A vida que parece ser boa sempre carrega em si uma mácula qualquer. E a vida que parece ser horrenda carrega em si uma esperança infinita. Para o mundo ser melhor todos teríamos de sofrer e neste mundo existem mais pessoas iguais a você que não sabem sofrer ao menos um instante. O que fazer então?’
                O jovem atormentado não sabia o que pensar. Por qual motivo tal estranha falava tanto dele sem ao menos o conhecer. Por que ela carregava tanta revolta e dor em seu olhar? No meio de seus pensamentos, ecos de uma consciência distante, ela prosseguia:
                ‘-Acorde! Perceba que seu mundo é supérfluo e superficial. Saiba ajudar, saiba ser livre. Não viva entre máscaras. Seja humano, viva. E se esse discurso ainda te incomoda é porque tenho razão ao te olhar assim, como um verme vestido de palhaço, cheio de picardia. Num palco de máscaras sendo fantoche do dinheiro, do ódio e do conformismo. Inutilia Truncat! Inutilia Truncat! Despertai porque isto é a vida! Eu não posso te explicar com palavras todo o resto, mas você e somente você poderá ver e assim entender. Despertai!’
                O pobre jovem burguês estava atordoado e exausto. Este encontro, este choque, este sonho fora pesado demais. Ele se sentia como se acordasse em uma vida que não era a sua. O seu dia não pode ser igual e ele ainda se perguntava o que tinha de real naquelas memórias. De repente, enquanto caminhava pela rua, tem em sua frente a mesma jovem da sua memória.  Ela o olhou e seguiu em frente.